E por que a depressão ainda é um tabu?
o jornalista Ricardo Boechat escreveu, em sua página do Facebook, sobre ter sofrido um surto depressivo recentemente. O relato é corajoso e sensível e mostra que ainda há muito o que ser discutido sobre a depressão.
A doença muitas vezes é vista como uma frescura e é tratada como se fosse tabu. Ainda assim, Boechat não está sozinho. Um estudo realizado pela Federação Mundial de Saúde Mental mostra que uma em cada 20 pessoas tem depressão. A instituição estima que a doença afeta cerca de 350 milhões de pessoas ao redor do mundo.
“Os quadros de depressão podem ser leves e às vezes são confundidos com questões de personalidade, como se fosse um tipo de frescura”, diz André Brunoni, coordenador do Serviço de Neuromodulação do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (IPq-USP). “Esse tipo de comportamento faz com que o próprio paciente não se sinta estimulado a procurar tratamento no começo ou perceba os sinais de depressão que está apresentando. Ele só vai se tratar quando o quadro fica grave.”
A depressão é causada por dois fatores: a genética e o ambiente. Isso significa que aqueles que têm um histórico familiar de depressão correm um risco maior de serem afetados pela doença. E algumas características do ambiente de convivência do indivíduo, como estresse e pouca valorização, podem ser decisivas para a saúde dele. Fora isso, há uma série de eventos que ocorrem ao longo da vida que podem levar alguém a ter depressão. O luto e o período pós-parto, por exemplo, são alguns deles.
Quem tem a doença sofre alterações no córtex pré-frontal, região do cérebro responsável pela tomada de decisões e julgamentos do que é certo e errado. Muda também a neuroplasticidade, ou seja, a capacidade dos neurônios de se comunicarem entre si. A sensação que um indivíduo tem durante um surto depressivo, segundo o psiquiatra, é de dificuldade em processar informações e agir, como se o cérebro não estivesse funcionando muito bem.
Ao longo do surto o corpo também sofre outros tipos de alterações, como o aumento na produção de cortisol. O excesso do hormônio aumenta a adrenalina no sangue e faz com que a variabilidade da frequência cardíaca do paciente diminua.
O tratamento para a doença varia de acordo com a gravidade. De acordo com André Brunoni, quadros leves e moderados podem ser tratados a partir de mudanças no estilo de vida, como exercícios e alimentação. Em casos mais sérios, é necessário contar com a ajuda de antidepressivos.
Como nem todos os pacientes podem adotar a medicação, seja por conta de outros remédios ou condições pessoais, novas técnicas de tratamento estão sendo desenvolvidas. Uma delas é a estimulação magnética transcraniana, na qual um pulso eletromagnético é gerado no córtex pré-frontal de forma a estimular a neuroplasticidade. “Essa técnica não tem efeitos colaterais, o que é muito importante pois é comum que pacientes melhorem por conta dos remédios, mas sofram com ganho de peso, perda de libido, problemas gastrointestinais. Se elas param de tomar a medicação, a depressão volta e cria-se um ciclo vicioso”, afirma Brunoni.
No momento, o psiquiatra e outros profissionais da área estão pesquisando a possibilidade de o tratamento ser mais eficaz que o uso de medicamentos. Por isso, farão o estudo a partir de 240 voluntários – ainda há 40 vagas, os interessados podem entrar em contato com os pesquisadores através do e-mail pesquisa.depressao@gmail.com.
Dados do Instituto de Psiquiatria da USP mostram que 15% das pessoas terão algum tipo de depressão ao longo da vida. Com tanta gente propensa a ser afetada por essa doença, relatos como o de Boechat e outros profissionais que atingem um maior número de pessoas, como Dan Harris, apresentador do programa americano Good Morning America, e da jornalista e roteirista Mariliz Pereira Jorge, são importantes e necessários.