A fosfoetanolamina sintética, conhecida como pílula do câncer, começará a ser testada em humanos a partir da próxima segunda-feira (25), em São Paulo. Essa fase da pesquisa clínica está sendo conduzida pelo Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo), que já recebeu do laboratório oficial da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, cápsulas suficientes da substância para a realização da pesquisa.
É a primeira vez na história que a fosfoetanolamina sintética será testada em humanos, com o objetivo de analisar a eficácia da substância no combate ao câncer. Em estudos feitos com animais e em laboratório para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações, a substância apresentou pouco ou nenhum efeito contra o câncer.
O estudo prevê uma primeira fase, em que serão avaliados 10 pacientes para determinar a segurança da dose que vem sendo utilizada na comunidade. Após essa primeira etapa, caso a droga não apresente efeitos colaterais graves, a pesquisa prosseguirá.
Os interessados em participar das próximas fases passarão por triagem e deverão preencher os critérios de elegibilidade para determinar a segurança da droga.
Depois disso, serão incluídos mais 21 pacientes em cada um dos 10 grupos separados por tipos de tumor — cabeça e pescoço, pulmão, mama, cólon e reto (intestino), colo uterino, próstata, melanoma, pâncreas, estômago e fígado.
O estágio 2 terá início quando forem observados sinais de atividade da substância no organismo. Nele, são incluídas mais 20 participantes em cada um dos 10 grupos.
Se a fosfoetanolamina sintética apresentar atividade relevante dentro do organismo dos pacientes, outros serão progressivamente incluídos até atingir o máximo de mil pessoas, 100 para cada tipo de câncer estudado. Todos os pacientes serão monitorados continuamente por uma equipe multiprofissional do Icesp.
“Nossa prioridade é a segurança dos pacientes, por isso, nesse primeiro momento, vamos avaliar, com grande responsabilidade, se a droga é segura e se há evidência de atividade. É um processo extenso, que deve ser acompanhado com cautela”, destaca o oncologista Paulo Hoff, diretor-geral do Icesp.
Uso está suspenso pela Justiça
A fosfoetanolamina sintética foi desenvolvida inicialmente por mais de 20 anos no Instituto de Química da USP (Universidade de São Paulo), em São Carlos, por uma equipe coordenada pelo professor aposentado Gilberto Chierice. Durante anos, a substância foi distribuída gratuitamente para pessoas interessadas.
Uma determinação da USP, no entanto, impediu a distribuição, o que fez com que muitos pacientes entrassem na Justiça para conseguir acesso ao medicamento. Muitos doentes garantem ter detectado efeitos positivos ao usar a “pílula do câncer”, mas análises iniciais não comprovaram sua eficácia.
Após diversos protestos e decisões judiciais, uma lei foi aprovada pelo Congresso Nacional, permitindo a comercialização e uso da substância mesmo sem registro da Anvisa, e sancionada pela presidente afastada Dilma Rousseff em abril. Em maio, o STF (Supremo Tribunal Federal) suspendeu a lei.
Até agora, testes foram pouco satisfatórios
O Supremo vai julgar novamente se a lei é ou não inconstitucional. Mas, enquanto isso não acontece, institutos de pesquisa investigam a eficácia da substância. Os primeiros testes, no entanto, foram pouco animadores, segundo cientistas.
O teste elaborado pelo CIEnP (Centro de Inovação e Ensaios Pré-Clínico) detectou que doses de 500 mg/kg de fosfo em camundongos com melanoma, um tipo de câncer de pele comum, foram suficientes para reduzir o tamanho do tumor em 34%. Contudo, outra substância, a cisplatina, teve resultados muito mais satisfatórios: 68% do tumor regrediram após o tratamento.
Outro teste feito pelo Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos da Universidade Federal do Ceará avaliou que, apesar de não ser tóxica, a “pílula do câncer” não teria nenhuma eficácia no tratamento do câncer.