Na novela Liberdade, Liberdade, que passa às 23h na Globo, Sheron Menezzes vive uma realidade que é muito presente em sua vida. Assim como a escrava alforriada Bertoleza, ela também sofre com o racismo. Recentemente, foi vítima de um ataque na internet e contou com o apoio de muitos colegas e fãs. A atriz garante que faz questão de se posicionar contra tudo o que a incomoda e Bertoleza também agia assim há 200 anos! “Seja racismo, seja algo contra os animais ou qualquer discriminação, eu falo. A gente tem esse poder e o direito como cidadão. Não são todos que têm coragem ou voz para falar.” Volta e meia, Bertoleza é questionada, até pelos próprios escravos, sobre sua forma de se vestir e se comportar – ela chegou da Europa já livre da escravidão e encontrou no Brasil da época da Inconfidência Mineira muito preconceito pelo fato de ser negra e se comportar como alguém livre.
Você acha que ainda há pouco espaço para atores negros nos dias atuais?
Não tem muitos negros em papel de protagonistas, por exemplo. Mas mesmo que não sejam tantos, temos alguns. Sou uma pessoa que tem um ponto de vista totalmente otimista. A coisa precisa melhorar? Sim, mas tem muita gente atuando nisso e acredito mesmo que muito está sendo feito pelos negros.
Ver o negro se destacando tanto é o que incomoda o preconceituoso?
Eu acho que a pessoa que está incomodada tem que se tratar. O mundo agora é outro, não é? A gente está falando de uma novela
que se passa em 1808. Se alguém ainda não entendeu, tem que procurar uma terapia para ajudar.
Como você vê a importância de se pronunciar sobre esse tipo de preconceito?
Acho que como pessoa pública é minha obrigação me posicionar contra atitudes que considero erradas. São as minhas crenças.
Então, quando vejo alguma coisa que me incomoda, seja racismo, algo contra os animais ou discriminação, eu falo. A gente tem esse poder, esse direito como cidadão. Não são todos que possuem coragem para falar. Se tenho a voz, devo dizer.
E como a sua personagem reage ao preconceito?
Acho que ela sofre muito, porque não se entende. Ela vem ao lado dos amigos lutando, mas não se entende naquele meio. Não se acha superior aos outros escravos, mas também não é tratada como eles, não se veste igual a eles. Acho que é uma luta igual aos
tempos de hoje. Ela não se encaixa ali. Mas sem as ferramentas que contamos nos dias atuais.
Como assim? A mulher hoje ainda sofre como ela?
Sim, ela se veste como dama, mas sofre muito. Acho que é muito parecido com o que acontece hoje. Acha que uma negra
advogada, uma negra médica, não sofre preconceito? Embora agora eu ache que já estamos em um caminho certo contra isso, ainda acontece.
Bertoleza na história do Brasil
Assim como Bertoleza, muitos outros negros conseguiram alforria antes de a escravidão acabar. O problema é que, diferentemente da amiga de Joaquina (Andreia Horta), quem comprava a liberdade dificilmente se integrava, de fato, à sociedade. “Era muito
comum ter um escravo livre prestando obediência ao seu senhor. E isso é reforçado pela cor, que registra na pele a marca do seu passado. Faltou para o negro alforriado essa inclusão na sociedade”, diz Renato Brigati, professor de História do Colégio São Francisco Xavier (SP). Outro problema: negros e negras que foram libertados pelos seus senhores, mas não podiam ir para outra
cidade ou seriam escravizados novamente sem ter como provar sua condição de homens livres. “O racismo não surgiu nos dias de hoje. Como eles podiam se integrar à sociedade se não tinham dinheiro para comprar terras?”, explica Renato.